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sexta-feira, 29 de junho de 2018

RICO AOS 40

Obviamente, em qualquer momento da vida, deve ser ótimo ser rico.
Mas imagine ser rico aos 40: as pessoas já não nos enganam tão facilmente, sabemos diferenciar bajulação de comprometimento, identificamos de forma mais precisa quem sim, quem não e quem nunca.
Aos 40, vivemos como um meio-campista habilidoso e experiente: corremos menos, mas produzimos mais e melhor, embora ainda tenhamos fôlego para os “piques” necessários. Antevemos jogadas, arriscamos com mais objetividade, somos donos de uma cadência mais precisa e cada lance tem exatamente a nossa cara, a nossa impressão, o nosso manifesto.
Imagine só que maravilha ser rico aos 40, quando a gente finalmente enxerga além das aparências, quando percebemos que a beleza que vem de dentro realmente é infinitamente superior a um corpo bem delineado, um par de olhos estonteantes ou uma boca sensual. E sim, essas coisas seguem sendo interessantes. O que muda são os critérios, as prioridades.
Certamente deve ser uma bênção ser rico num estágio da vida onde a gente percebe com clareza a diferença entre perda e livramento, entre o inevitável e a escolha, entre sucesso e ilusão.
Os 40 nos trazem a maturidade de saber quando partir. De perceber quando ficar. Aprendemos a importância do silêncio e o peso da fala.
Temos a consciência plena de que sempre podemos ser melhores. E, via de regra, ainda temos um tempo razoável para praticar isso.
Aos 40, o café tem outro gosto, a pizza tem mais sabor, o mundo tem mais cor. Pequenos e singelos momentos ganham grande relevância. E somente é assim porque a vida já nos ensinou de forma bastante incisiva o valor de cada coisa e de cada instante. É bem possível que já tenhamos aprendido que perdoar é uma bênção que traz infinitamente mais benefícios a quem perdoa.
Provavelmente já tenhamos entendido que na maioria das vezes o passado só nos fere quando assim permitimos. Que o dia de hoje realmente é um presente. E que o futuro, apesar dos pesares, depende única e exclusivamente de nós.
Aliás, não devemos esperar muito do passado... o que vem de lá não traz novidades. Os 40 nos ensinam a sermos seletivos o suficiente, no sentido de armazenar o que serve e deixar definitivamente para trás o que é pó. Somos obrigados a levantar âncora e fugir dos escombros.
Nesse período do vida já absorvemos e compreendemos plenamente a sabedoria da natureza, que fez o ser humano com dois olhos, dois ouvidos e somente uma boca. E esse é um aprendizado muito valioso.
Já pensou? Imagine ser rico aos 40... com marcas e feridas já cicatrizadas, cada uma delas lembrando e representando um momento importante que forjou o que somos e o que nos tornamos.
Quem já constituiu família tem parceria pra vida, pra dividir problemas e conquistas, pra comer pipoca assistindo um jogo, roncar enquanto o outro está vendo o filme que foi convidado/obrigado a olhar, pra xingar em dupla a conta da luz e o salário que não dá até o final do mês. E pra escolher em equipe qual será a “indiada” nas férias.
Nesse caso, é possível aproveitar melhor os filhos e ter a certeza de que cada conquista deles é infinitamente mais importante e gratificante do que as nossas. Finalmente temos a dimensão do que é amor de verdade. Dependendo da idade, os filhos finalmente entendem porque os pais são tão chatos antes e porque certamente continuarão sendo.
Ao 40 aprendemos a abandonar ciclos. Compreendemos que “tudo bem” se não for possível ter reciprocidade em relacionamentos. Não somos responsáveis pelo amor do outro, mas sim pelo amor que somos capazes de entregar. E se no auge de nossa entrega a pessoa não for capaz de perceber a importância e o valor disso, aceitamos que o problema não está em nós. Não podemos e não seremos definidos por aquilo que os outros fazem ou deixam de fazer, e não seremos eternamente feridos por sua incapacidade de amar.
O adeus dói, mas também é libertador. Não devemos fazer morada – nem mesmo repousar -onde não somos bem quistos, onde não somos desejados de verdade, onde sejamos forçados a “caber”.
Aos 40, abandonamos a autossabotagem. Dessa forma, muitos optam em seguir “sozinhos”. E são felizes, porque aos 40 eles já sabem exatamente quem são. E isso é suficiente para seguirem adiante, vivendo plenamente. A “metade da laranja” é uma lenda, que nessa idade já não assombra ninguém. Pelo menos ninguém em sã consciência.
Buscamos ser melhores do que aqueles que nos antecederam. Pra muitos o “eu te amo” ainda é uma frase difícil, mas tentamos. Exercitamos. E somos melhores na arte de amar, nos doamos mais, nos entregamos mais. Somos mais humanos. Somos mais gente. Mais sinceros. Portanto, mais íntegros.
Imagina, ser rico aos 40...
Saber e querer ficar em casa, sem a angústia do mundo exterior. Ter alguém que nos proteja, que faça tudo por nós. Ter alguém para quem sejamos inspiração, exemplo. Ter alguém pra dividir e pra somar. Encontrar felicidade num sorriso, num abraço, num chimarrão.
Ou simplesmente termos a nós mesmos. Acharmos um ponto de equilíbrio. Entender que muito pouca coisa é imutável de fato.
Não, a vida não é menos importante, ou “menor” antes dos 40. Ao contrário. Ela é maravilhosa, e é simplesmente maravilhoso constatar que segue sendo ótima e que pode melhorar ainda mais.
A imagem no espelho já não tem o mesmo viço, mas certamente ganhou mais experiência. As rugas abandonam padrões, nos libertam de estigmas. Já vivemos o suficiente para saber que não temos tempo a perder. Já perdemos pessoas suficientes para aprender que o dia de amanhã é incerteza pura. E que não devemos deixar para esse amanhã o abraço que podemos dar hoje.
Não, meu amigos. A vida não começa aos 40. Nessa fase já vivemos muito. Os 40 são uma espécie de consolidação, um pouco de colheita daquilo que plantamos até esse momento.
Ah, ser rico aos 40 deve ser demais.
Contudo, certamente o mais importante e interessante é chegar nessa fase da vida sem grandes – ou nenhum – arrependimento. É saber que até esse momento temos feito tudo da melhor maneira possível. É lutar os bons combates, defender as boas causas. É ter hombridade suficiente para corrigir erros, voltar atrás e dar um passo adiante de cada vez. E, finalmente, poder afirmar que, pondo de lado a falta de dinheiro (e isso é somente um detalhe), na realidade, já somos milionários. 


Caine T. Garcia



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