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segunda-feira, 9 de novembro de 2015

SILÊNCIOS DE BARRO E PEDRA



SILÊNCIOS DE BARRO E PEDRA

Nestes silêncios de barro e pedra
Pelos "adentros" de mim, padeço...
Há na incerteza, que vinga e medra
Talvez a  herança do que mereço!
...Teus sinos calam, verdade e espera
Que são a história, assim, do avesso...
Em teus guardados, os memoriais
Contam a senda dos ancestrais
Gritam o passado, a cobrar seu preço...

Os caserios desses joões-barreiros
- Fortins erguidos com pena e suor
São como os sonhos de tantos “guerreiros”
Que de sua alma, deram o melhor...
Guardam anseios, de quem primeiro
Fez desta pampa, um lugar maior...
Pontas de lanças e imagens tantas
São testemunhas, nesta terra santa
De uma luta insana, que semeou a dor...

Entre os umbrais que te permeiam
Escuto vozes... em tons de conselhos!                    
Pra o índio incréu, meros devaneios
Mas eu sei que a elas me assemelho...
Sou como as almas, que aqui andejam
- Irmãs antigas, deste chão vermelho!
Sempre fui terra, entre várias vidas...
Ao retornar agora, pra lamber feridas
Minhas memórias, me põem de joelhos!

Ainda marcado pelas circunstâncias
Eu jamais vergo nestes descaminhos!
Peão sem chão, não tenho estância
Nem sou afeito a muitos carinhos...
Mas guardo minha fé, nesta constância
De buscar meu “eu” e mover moinhos...
Tenho a firmeza das tuas paredes
Em tuas entranhas, mato minha sede
Espírito livre, que retorna ao ninho!

Nestes silêncios, de barro e pedra
O dia cansa e, enfim, adormece...
E quando de novo, ele encantar a lua
Talvez o sol ainda me encontre em prece...

Respiro a magia em tua fortaleza
Quantos “Sepés”... e quantos avós!
Sei que sou parte da tua natureza
Mesmo em ruínas, não me sinto só...
Gritam os de antes, não há voz presa
Hei de orgulhar-me de voltar ao pó!
Nesta simbiose entre homem e terra
Me alimento do que em ti encerras
E o coração já se desfaz dos nós...

Braços me abraçam... vejo a cruz silente
Há sal nos olhos, a nublar-me o olhar
Há o tempo algoz, que não se ressente
Das dores que trago... deste meu pesar
O solo sangra, o Homem ainda mente
Sobre o que os livros não irão contar...
Não há limites para os sentimentos
Nem para as razões que pateiam dentro
De quem traz Missões no seu andejar...

Minh’ alma índia, rompeu as fronteiras
Buscando a benção no chão guarani...
Linhagem “gaucha”, estirpe guerreira
Alma de campo, a liberdade em si!
Seguiu o grito das vozes campeiras
E de todo sagrado, que emana de ti!
Me fiz coragem pra singrar querência
Atendi apelos de minha consciência
Sei bem quem sou e ao que sobrevivi!

Nestes silêncios, de barro e pedra
Ecoam missais - e minha oração
... sem boleadeiras – mas pronto pra guerra
A esperança me estendeu a mão

Quero em teu barro, poder renascer
E em tuas pedras, ter meu alicerce
Sei que um novo tempo irá acontecer
Onde o amanhã, ao ontem reconhece...
De tanto ver a pampa amanhecer
Aprendi que à noite, as dores recrudescem...
...mas sonho caciques juntando-se a mim
Prá um novo embate, que bem lá no fim
Reescreverá meu Sul, como ele merece!

... quem sabe os sinos, algum dia, à frente
Vão além das vozes que ninguém traduz...
E gritem à pampa, o que a tua semente
Deixou de legado, aos olhos da Cruz
E de novo dobrem, pela nossa gente
Que ainda sonha um tempo de luz!
A todos fascina este povo lendário
Que bradou coragem pelos campanários
E que ao próprio tempo, até hoje seduz...

Nestes silêncios, de pedra e barro
Há um ritual de entrega, onde me fortaleço
Vendo o que prezo e que me é tão caro
Sei que a justiça errou de endereço!
Ao meu povo índio, hoje me agarro                       
E a ele dedico minha reza em terço
Fecho meus olhos – já não há rancor
Aceito a “cruzada” sem nenhum temor
Deixo a matéria e, enfim, adormeço!

Poema: Caine Teixeira Garcia

Amadrinhador: Zulmar Benitez
Intérprete: Jair Silveira




quarta-feira, 4 de novembro de 2015

A IMINENTE CATÁSTROFE CULTURAL

Todos sabem que sou um defensor dos CTG's, dos movimentos tradicionalistas, ainda que com várias ressalvas. Assim, reforçando essa ideia, afimo que a questão do "tu" e "você", embora pareça um assunto simplório, pode ser vista como um sinônimo de aculturamento. Esse me parece o motivo mais direto e impactante para o fato de que, cada vez menos, tenhamos gaúchos utilizando o "tu". Bobagem?Cito: Bagé, por exemplo, já foi uma cidade de grandes atividades tradicionalistas, com um CTG em cada canto, cada um deles com  invernadas que iam da fase mirim até a xirua, com atividades diversas, onde se disseminava o "tu", em nosso dialeto tão próprio. E hoje? Bom, hoje pouco temos disso, cada vez menos temos essa convivência com nossa cultura e nosso linguajar antes soberano. As pessoas têm acesso às nossas coisas em segundo - ou terceiro - plano. Acabamos com as invernadas, com as domingueiras, com os churrascos em CTG's aos domingos, com os bailes pilchados. Ou seja, deixamos que a cultura externa viesse invadir nossa "praia". Sempre haverá discussão quanto a essa cultura "cetegeana", suas verdades, seus exageros e tudo mais. Mas o fato, é que nossas crianças e jovens são bombardeadas hoje em dia por uma enorme gama de culturas externas e alheias ao que estamos acostumados, que chegam via smartphones, computadores, iphones e sei lá mais o quê. Enquanto isso, não conseguimos construir atrativos suficientes para que eles possam aderir ao que é nosso, para que possam seguir cultuando algo que é lindo e que eu, particularmente, tenho orgulho de saber que é cria destes pagos. Então, na verdade, o "tu" talvez seja somente o começo. Do fim. Assim como o aquecimento global avisa sobre futuras catástrofes climáticas, o abandono do "tu" avisa sobre uma iminente catástrofe cultural