Tenho lido bastante a respeito da
manifestação do Sr. Juarez Fonseca. Em alguns casos, tenho opinado no perfil
dos amigos e conhecidos, quando vejo que tenho intimidade para tal. Minha
última manifestação havia sido aqui mesmo, no blog.
Contudo, ao ler a manifestação do
mestre Luiz Carlos Borges, referência musical dentro e fora do RS e do país e,
em respeito ao fato de que não temos uma intimidade maior, gostaria de ponderar
algumas coisas aqui, pelo meu cantinho mesmo.
Começo afirmando que, no meu
entendimento, não estamos coesos. Aliás, acho que estamos longe disso, uma vez
que coesão pressupõe uma certa ligação íntima, afinada, o que de fato não
existe em nosso meio e seus vários segmentos.
"Assuntamos" sim, como bem disse o
Borges, sobre o meio artístico-poético-musical, mas muito pouco. Quase nada.
Sempre na superficialidade (no que se refere ao envolvimento de grandes grupos,
ou questões realmente decisórias, que possam fazer alguma diferença). Uma prova
disso que estou afirmando, é o surgimento do movimento “Tchê abraça Rio Grande”,
que busca efetivamente um debate mais profundo sobre as questões que necessitam
ser tratadas no meio e que insistentemente são deixadas de lado, exatamente
pela falta de coesão, de alinhamento mínimo de rumos e estrada.
Estaríamos coesos se estivéssemos
buscando soluções para melhorar a vida e o trabalho dos artistas que promovem
nossa cultura, ao invés de termos que gastar tempo trocando ideias – e, em
algum momento, até farpas – devido a um texto totalmente infeliz escrito por
alguém que parece ter tirado o dia para achincalhar um movimento da maior
importância para nossa cultura, nivelando por baixo centenas de artistas,
inclusive aqueles que ora o estão defendendo.
A questão referente à coluna escrita
pelo Sr. Juarez Fonseca não se trata de um debate, pelo menos não para a
maioria das pessoas com as quais tenho conversado e outras tantas que me mandam
e-mails, mensagens e torpedos a respeito do assunto, deveras indignadas e
magoadas com o nível de abordagem e com o desprezo demonstrado pelo colunista
no que se refere aquilo que produzimos no âmbito festivaleiro.
Talvez o posicionamento de Luiz
Carlos Borges, devido ao peso cultural que ostenta e à envergadura de
importância que tem para o nosso meio (meio século dedicado à música e mais de
trinta registros fonográficos) possa aplacar e amainar as frustrações e
desencantos que andam por aí, na boca e no pensamento de grande parte dos
nossos artistas, em especial, aqueles que ainda não possuem uma carreira mais
sólida, um reconhecimento maior, uma vez que muitos ficam, digamos,
constrangidos de emitirem sua opinião, contrariando alguém de tamanha
influência. Mas essa frustração e esse sentimento de desrespeito também reverbera
entre os grandes da nossa cultura, e isso é certo. Não sou um destes maiores,
bem longe disso, mas também não gosto que me pisem no pala, e já que todo mundo
está no direito de dar sua opinião, eu entendo que o contraponto sempre é
salutar e pode dar uma visão melhor sobre outros ângulos, que às vezes fogem ao
umbigo do opinador.
Como bem escreveu o Borges, a
questão de músicas boas ou ruins, não vem de agora. E sempre existirá. Isso
acontece na exata proporção em que se aumentou a abertura de espaços (ainda que
bem menos do que o necessário) e que a produção musical hoje realizada no
Estado é infinitamente maior. O Robledo Martins bem lembrou em sua manifestação
sobre o assunto: antigamente o interior não tinha estúdios, gravar uma música
com um pouco de qualidade era um parto. Entrar nos festivais, então,
concorrendo com o pessoal da capital, cuja estrutura era bem maior, era quase
impossível. Mas as coisas mudaram. Os músicos do interior persistiram, aqueles
que não ainda não eram consagrados persistiram, e hoje nos brindam com seus
trabalhos, cujo crítico maior – e verdadeiro - é o ouvinte, o público.
Eu não conheço o conteúdo da tal “Carta
de Uruguaiana”, mas com certeza a grande maioria dos músicos que iniciaram
naquela época ou um pouco depois não se guiaram por ela, pelo que pude entender. Se assim fosse,
talvez não tivéssemos hoje um Luiz Marenco, ou um César Oliveira e Rogério
Melo, ou Jean Kirchoff, Anelise Severo, ou Sperandires, ou Nílton Júnior, ou Grupo Missões, ou Robledo Martins, ou
Xirú Antunes, ou Severino Moreira, Rômulo Chaves, Juliano Moreno, Daniel
Cavalheiro, Marcelo Oliveira, Nílton Ferreira ou tantos outros que eu poderia
citar aqui (e desde já peço escusas por utilizar os nomes como exemplos, é
somente a título de esclarecimento de minha “tese”), atuando no cenário poético-musical.
Ainda que o conteúdo da tal missa
possa estar recheado de boas intenções, certamente elas são extremamente
pessoais, revelando o posicionamento de um grupo específico, em detrimento do
pensamento dos demais. Em detrimento a um contexto. E hoje, ignorando uma
mudança de mais de trinta anos. Talvez aos olhos de outros, essa tal carta não
passasse de uma maneira de firmar aquilo que chamamos rotineiramente de “panela”...
será que não? Mesmo que inconscientemente?
Creio que seja uma questão de
ponto de vista, afinal, pelo que me chega de informações e pelo tipo de “alerta”
que dela se extraía, tal documento visava apenas ratificar uma certa maneira de
compor, dizendo o que era ou não bem
visto, ou o que estava errado, o que era chato, o que era mal construído, fora
dos padrões e conceitos daqueles que a escreveram. Ou seja, me parecer que tinha
por objetivo bitolar e direcionar a produção poético-musical, muito mais do que
orientar. Confesso que não tive oportunidade de ler essa “tábuas dos mandamentos
dos festivais”
Não obstante, lembro novamente
que alguns discos da Califórnia e outros festivais da época, apresentam músicas
com qualidade muito, mas muito inferior dos que a que temos hoje nos palcos de
festivais, mesmo naqueles de menor estrutura.
É, minha gente... no passado se
fazia muita música podre, sim... e elas ganhavam festivais, também. Com os jurados
da época... entendem?
Me causa estranheza, por
exemplo, fato de que grandes nomes do
nosso meio não debatem em público as questões estruturais dos festivais, como a
própria Califórnia, que deixou de ser um exemplo (vive sim, na memória cultural
do Estado, tem todo um significado e importância) para ser uma vergonha, onde
todo e qualquer tipo de absurdo acontece. Com depoimentos do pessoal da própria
cidade, inclusive. E outros tantos problemas que temos de cunhos estruturais,
financeiros e políticos.
Discordo também de Luiz Carlos
Borges quanto à questão de “involução” na música do Sul. Isso não é verídico. O
que temos hoje é mais produção, mais abertura, mais espaço (e digo de novo,
pouco perto do que deveria existir), e isso naturalmente aumenta o número de
músicas boas e ruins, faz oscilar a qualidade. Não é óbvio, isso? Isso não
acontece com todos os artistas do cenário nacional e internacional? O que dizer
então de um evento que, teoricamente, é aberto para o surgimento de novos
talentos... as pessoas estão proibidas de tentar, então? Não há chance para o
erro, para o estímulo, para o gosto particular e personalíssimo?
Se fosse pela cabeça de muitos dos
antigos, dos de antes (aos quais todos devemos respeito e reverência pelo que
fizeram até aqui, com certeza), não teríamos nunca novos talentos, uma vez que
grande parte deles consolidou sua carreira e hoje vivem tratando de fechar cada
vez mais seus grupos e acertos, buscando não dar espaço a ninguém que não lhes
seja de afeto pessoal, ignorando a capacidade e o talento dos que hoje estão na
batalha. Veja as contratações de shows para eventos oficiais e já matamos essa
charada. Diga aí, o que tem de novo??? Como o novo pode surgir se o que temos é
quase sempre, o de sempre? E de quem é a culpa?
Muitos destes que falo,
inclusive, têm se dedicado mais à política e aos bastidores de televisões e
eventos do que propriamente à uma produção que agregue algo para a cultura e
para a classe artística.
Se alguém souber me dizer ou
listar o que EFETIVAMENTE o Estado (em todos os governos) tem feito em prol da
melhoria dos festivais e da qualidade de vida dos artistas, me corrija aqui. Só
não vale falar em Editais da LIC, onde alguns produtores culturais e eventos
ganham bem mais do que os artistas (salvo os privilegiados), porque essa coisa
de LIC existe desde sempre. Estou falando em atuação, de interação, de levar o
debate real ao nível de profundidade em que é preciso. De apresentar
alternativas viáveis para que muitos artistas tenham outros espaços e outras
oportunidades além dos palcos dos festivais e do que deles decorre.
Embora respeitando, afirmo que profundidade
foi o que faltou, tanto na coluna do Sr. Juarez, quanto na manifestação desse
grande gaiteiro do Rio Grande. Isso é fato.
Contudo, embora Luiz Carlos
Borges seja um dos maiores músicos da história do nosso Estado, com larga
estrada cultural, não posso fazer como muitos e me calar em um momento em que o
nobre artista defende o tanto de bobagens e de ofensas que o Sr. Juarez Fonseca
publicou, afrontando toda uma classe, ainda que muitos estejam, agora, fazendo
vistas grossas. É preciso ser legítimo.
Veja que no rol de artistas que Borges
citou como importantes, não houve menção a Noel Guarany, Jayme Caetano Braun,
Luis Marenco, Joca Martins, Gujo Teixeira, e tantos outros que já citei
anteriormente.
Será que minha visão está tão
falha assim?
Ao meu ver, muitos dos problemas
de separatismo que temos hoje na música do Rio Grande, têm sua origem em tipos
de pensamentos como estes, alimentados pelo Sr. Juarez, lá atrás, e aos quais
hoje, pra minha decepção (mas com respeito a opinião), Luiz Carlos Borges
defende.
Vejam que são passados 35 anos e
parece que as cabeças não mudaram. Então, quem está errado? Quem é que está
imerso na mesmice? Quem é que está apostando na mesma fórmula de sempre?
É preciso que tenhamos
autocrítica sim, sempre. Mas isso também é personalíssimo. Assim como também são
os estilos e as maneiras de escrever e compor. É preciso respeitar e aceitar o
fato de que hoje temos sim, manifestações plenamente afirmadas em nosso cenário
cultural que não condizem, talvez, com aquilo que o Sr. Juarez (e os seus colegas
produtores da tal carta) entenda como perfeito ou aceitável.
E lembro: ainda temos muitos dos “antigos”
conosco, brilhando e encantando pelos palcos dos festivais, em todo o Rio
Grande.
Não podemos aceitar críticas
pessoalizadas ou direcionadas a uma classe inteira, ainda que em algum momento,
alguns de nós estejam “por cima da carne seca”. Muitos podem até fingir que
não, outros talvez não tenham o entendimento, mas o Sr. Juarez não poupou NINGUÉM,
salvo aqueles que, na parte menos amarga do seu coração, ele guarde com o
carinho que lhe seja possível demonstrar.
Mais do que isso, já disse em
manifestações anteriores... e não vou tecer comentários sobre possíveis
interesses escusos, porque seria muito gasto de energia.
É lamentável, sim...
MAS NÃO ESTAMOS COESOS, COM
CERTEZA.
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