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sexta-feira, 22 de setembro de 2017

O CHEIRO DA INFÂNCIA




Por vezes, ando perdido, "me encontrando em mim"...

Durante as inconstâncias do dia a dia, quem nunca parou para respirar ou para tomar um fôlego? Quem nunca se aquietou a fim de realinhar os rumos, e encontrar o tino certo para a caminhada? Quem nunca buscou asilo momentâneo nos próprios pensamentos ou serenou para buscar a paz interior, no intuito de lamber suas feridas? Quem nunca?

Nessas horas mais desamparadas, quando a fadiga psicológica é enorme, não raro, eu sinto o cheiro da minha infância... é quase infalível. Parece que o ato de “ausentar-me” do mundo, funciona como uma espécie de cápsula do tempo, que me devolve aos primórdios da minha vida.

E não é ruim, muito pelo contrário.

Penso que o estado meio involuntário - embora consciente - de estar mais absorto, privilegia meus sentidos, aguçando minha “memória olfativa”.

O olhar mais atento - ou desprovido de distrações - e o cotidiano como um todo, também são capazes de realizar essa magia. O café com leite, o sol queimando na pele ou o frio das geadas grandes que costumam embelezar as manhãs aqui do sul do sul...

O aroma das folhas de um caderno ou de um livro novo... a chuva levantado a poeira das ruas, a umidade pairando no ar...

Até mesmo as esquinas e as pedras das ruas, caserios e calçadas, "bolichos" antigos... o campo, a terra, ranchos, galpões, taperas e potreiros... algumas paisagens antigas, que vislumbro e me fazem retroceder algumas centenas de anos (eu sei!).
Uma pandorga solta ao vento, uma bicicleta antiga, cicatrizes (da matéria e do espírito), os quase extintos carrinhos de rolimã: tudo isso me remete aos tempos de infância, no momento em que a sensibilidade aflora! O encontro com antigas amizades, um mate que se acomodou bem da forma como alguém importante já cevou um dia, em tempos idos... um sorriso sincero, um abraço apertado, um dia cinzento...
Um gorjeio de pássaro, triste ou feliz, que entoa exatamente as mesmas notas que marcaram minha vida em algum distinto momento, lá longe no tempo...
Contudo, poucas coisas me trazem essa sensação tão boa e de forma tão intensa, quanto os dias quentes, ensolarados e floridos da primavera.

Ah, o florescer da primavera, com seu colorido perfumado, marcando mudanças profundas nos ânimos da natureza e do nosso meio, gritando esperanças. 
Tenho a impressão de que meus melhores dias de infância foram vividos nessa estação. Memórias totalmente espontâneas, indescritíveis e inesperadas me vêm à mente quando esses fatores peculiares e primaveris entram em cena. Uma grande parte desses importantes - e simples - momentos que volto a desfrutar, está intimamente ligada a questões familiares, detalhes singelos de paz, calmaria e ternura. E acreditem, não foram tantos assim.

Talvez por isso eu valorize tanto essa estação maravilhosa, que traz consigo o cio das descobertas, de novos aromas e o despertar da coragem no corpo e na alma. Certamente é por isso que o desabrochar das flores se faz tão especial aos meus olhos: minha infância talvez não tenha sido tão fácil quanto a da maioria das crianças, mas eu acreditei nas primaveras. Eu escolhi crescer e florescer! Eu preferi seguir os melhores aromas, os caminhos mais esperançosos e iluminados. E ainda sigo em busca de tudo isso.

Eu espero estar bem longe do ocaso terreno das minhas primaveras, pois quero seguir olfateando minha infância a cada novo setembro, pois isso me renova e revigora. Dessa forma, eu sei melhor de onde vim, os caminhos que trilhei e tenho a possibilidade de relembrar as escolhas que fiz, mantendo acesa a esperança e a constância de progredir.

É sempre um bálsamo perceber que, apesar de tudo, a vida sempre guarda bons momentos, e que somos capazes de revivê-los de alguma forma. Mesmo nas dificuldades, mesmo quando estamos diante de obstáculos que parecem intransponíveis, ainda assim, haverá a primavera. Mesmo que estejamos desguarnecidos pela nossa vulnerabilidade ou inocência, ou pela nossa culpabilidade e prepotência, ainda assim, existirão as flores.

Isso, de fato, me conforta!

Seja bem vinda, primavera!











sexta-feira, 25 de agosto de 2017

A LENDA DO TRABALHO PERFEITO


Quem nunca ouviu ou leu a famosa frase do filósofo Confúcio, na qual ele dizia: "Escolha um trabalho que você ama e você nunca terá que trabalhar um dia sequer na vida” ?
É uma frase recorrente entre grandes palestrantes motivacionais, empreendedores e pessoas de sucesso. Além de recorrente, é uma frase verdadeira, inspiradora e que certamente, repetida à exaustão, já deve ter feito muita gente mudar de vida, ir em busca de seus objetivos e, não raro: quebrar a cara!
Sim, quebrar a cara, pois apesar de ser uma linda frase, plenamente aplicável e entendida por qualquer ser humano que possua um pouco de bom senso, INFELIZMENTE, ela não expressa uma regra do mundo real.
A vida adulta, a nossa vida real, é bem mais complexa do que essa “sentença” de Confúcio. Nem tudo depende de nossa força de vontade e de nossa capacidade de entrega. A vida impõe circunstâncias pesadas, percalços e questões pragmáticas que em grande parte das vezes, acabam por tolir nossas intenções e definições de rumos.
Afinal, quantas pessoas no mundo são capazes de escolher seu trabalho? Que condições a sociedade de hoje – e de sempre – dá às pessoas para que elas possam, efetivamente, trabalhar naquilo que gostam, desejam, com o qual possuem afinidade e, muitas vezes, vocação? Temos tempo, persistência e dinheiro para isso?
Ouço muito essa frase entre amigos, “adversários”, entre grandes pensadores e também entre aqueles que mal sabem o que estão dizendo, podendo ser considerada - sem nenhum exagero - como um “mantra motivacional”!
Mas devemos ter cuidado, pois esses “mantras” mal interpretados podem criar frustrações profundas, estresses desnecessários e, por certo, uma busca eterna por algo que não está dentro da nossa realidade em determinado momento, sendo, em muitas das vezes, de fato inalcançável, por força das circunstâncias.
A fase adulta, a família, as amizades, o cotidiano e a nossa sociedade requerem, primeiramente, RESPONSABILIDADE, COMPROMETIMENTO, DÍVIDAS PAGAS, CARNÊS EM DIA e CAPACIDADE DE SE AUTOSSUSTENTAR, com um mínimo de dignidade.
Todas as questões que envolvem nossa vida nesse sentido toleram nossas quimeras apenas por um certo tempo, pois a realidade cobra o preço de quem vive como eterno sonhador e insatisfeito.
Tenho amigos que são extremamente felizes com seus empregos, com seus trabalhos. Não sei ao certo se pelo fato de terem escolhido algo que lhes agradasse ou simplesmente porque nunca pararam para pensar nisso. Se o fizeram, talvez não considerem esse item tão importante assim. Contudo, tenho outros tantos amigos que são infelizes, praguejam o tempo inteiro contra seus empregadores e empresas onde trabalham. Entre uma cerveja e outra (pagas com o “soldo” de seus empregos), vociferam contra o local onde labutam e, consequentemente, contra sua vida infeliz, desvalorizando o próprio suor.
Esses últimos, ao fazerem dessas manifestações uma espécie de “regra cotidiana”, fecham os olhos e o coração para o fato de que NADA vai mudar em suas vidas com esse tipo de atitude. Pelo menos não para melhor.
Alguns dirão que esse é um texto pessimista, desmotivador. Prefiro entendê-lo como realista, apenas. Um lado mais duro, mas também alentador dessa moeda. Estar preparado para adversidades sempre me parece ser uma boa pedida.
Ao contrário de ser pessimista, estou aqui afirmando que é possível ser feliz sim, apesar dos pesares.
Com certeza é necessário que tenhamos bons objetivos, que almejemos o melhor sempre e que lutemos por aquilo que nos faz feliz e completo profissionalmente. Mas é preciso que tenhamos os pés no chão e que saibamos que existem muitas outras realizações que podem nos trazer um pedacinho do paraíso na terra: família, amigos, esporte no final de semana, uma boa cerveja, uma carne assada, um violão, algumas piadas, bons livros e qualquer viagem...
Se ainda não estamos trabalhando exatamente com o que pensamos ser nossa motivação e vocação profissional, que façamos dessa bênção que é o trabalho que temos uma mola propulsora para nossa evolução, progredindo sempre que possível e dando o nosso melhor. A sensação de dever cumprido e o comprometimento com aquilo que nos é confiado cria um círculo de bons momentos, de motivação natural, fazendo com que muitas coisas boas aconteçam. E isso pode, enfim, culminar com que talvez tenhamos conceituado como sucesso.
“Fazer do limão uma limonada” encaixa-se bem para todos aqueles que ainda não estão plenamente satisfeitos com suas atividades, com seu modo de pagar as contas, de existir profissionalmente.
Muitas pessoas passam praticamente uma vida inteira atrás de um objetivo profissional, e quando alcançam percebem que perderam todo o tempo que tinham em busca de algo que efetivamente não as completava. Se desfiguram pelo caminho, não percebem as paisagens, não usufruem das coisas boas.
O importante em nossa trajetória é que sejamos “GENTE”! Conseguir habitar esse mundo de forma digna já é uma grande vitória, não façamos pouco caso disso.
Persiga seus sonhos! Sempre que possível, mantenha “um olho no peixe e outro no gato”, pois todos merecemos o melhor, assim como a felicidade deve ser realmente um objetivo. Contudo, entenda que muitas vezes estamos infelizes com nossas vidas justamente por estarmos buscando uma felicidade que, via de regra, já nos habita, estando desde sempre ao nosso alcance.
Progrida, evolua, faça o que tu gostas, mas não crie regras demais, não seja exigente demais para ser feliz. Torne o lugar onde estás hoje em um ambiente agradável, aceite-se nele. Se estiveres transbordando, vá em busca de outro. Se estiveres diminuído, busque pelo reconhecimento, por algo melhor. Mas lembre-se sempre: o trabalho mais perfeito que existe, é aquele que nos confere mais dignidade, que nos permite pagar nossas contas, que nos deixa extenuado e até mesmo estressado, mas que nos garante um sorriso no rosto por estarmos honrando com seus compromissos, e provendo o que nos é necessário.
Não acredite em lendas hipócritas ou em contos de fadas, pois as que realmente valem a pena só existem na cabeça dos pais e dos avós, ou em livros e no cinema. Use o lado bom da filosofia. Trabalhe, respeite os seus, leia livros, assista a filmes e vá ser feliz, da melhor forma possível.  
A lenda do trabalho perfeito é uma mula sem cabeça que não existe... 


Imagem: Internet, desconheço o autor


quinta-feira, 17 de agosto de 2017

UM BRINDE À VIDA!!!

A morte é sempre um atropelo, é visita indesejada...
Não há quem a receba bem, ou que a espere de fato. Ainda que nas situações mais críticas seja ruminado o velho jargão "parou de sofrer", ninguém a deseja, nem no derradeiro momento...
Por mais elevado espiritualmente que possamos ser, penso que ninguém está realmente preparado para partir... e que nada consola realmente aos que ficam...
A morte é sempre indigesta, desapegada e o adeus que orquestra é, via de regra, alicerçado na dor, no sofrimento, na incerteza e na desesperança.
É uma senhora desaforada, desrespeitosa e não tem escrúpulos... não se comove com lágrimas. Nem mesmo o "todo poderoso" dinheiro pode impedir sua ação. Mais cedo ou mais tarde ela acaba se apresentando, levando o seu olhar obscuro e os seus desejos de fim até mesmo aos mais belos salões aristocráticos.
Por impiedosa, até se vende a uns trocados, mas não cumpre promessas, não garante retorno e destrói futuros. Brinca, em seu humor negro, mas não se envolve.
A morte é "veiaca", não observa razões... é doença sem vacina, é insensata e mordaz... Sendo o oposto da vida, às vezes me parece mais forte... todos sabem que ela é inarredável, até mesmo antes do nascimento.Vejam o quanto isso não é curioso e assustador!
Porém, uma coisa podemos - e devemos - afirmar: em seus critérios, ela é justa! Não respeita cargos, posses, fama ou coisas parecidas... possui as mesmas intenções para com todos, ou seja, arrebatar a vida!!
Só existe uma forma de vencê-la, de derrotar seu "espírito de porco": sobrevivendo além da vida, nos corações e na alma daqueles que nos querem bem, com nossa histórias, com nossos pensamentos, com nosso mundo peculiar e nosso jeito único de ser... ah, benditas sejam as lembranças e as memórias!
Pois é...resta ao menos a certeza de que a morte jamais terá o brilho de uma vida muito bem vivida...
Assim sendo, um brinde à vida!!! E que a morte, essa senhora desajeitada e maldosa da qual estávamos falando, pereça de inveja...

sábado, 15 de julho de 2017

SÓ O TEMPO ENSINA

Só o tempo ensina algumas lições importantes:
- que saber dizer não, muitas vezes é melhor do que falar sim, tanto para quem diz quanto para quem recebe;
- que vale a pena pensar bem antes de falarmos certas coisas (ainda que estejamos certos), pois a palavra é uma flecha que após ser lançada, certamente irá atingir sentimentos, para o bem e para o mal;
- que paixão e amor podem coexistir, mas não são a mesma coisa;
- que apesar da beleza física sempre encantar aos olhos, é preciso muito mais para cativar a alma e o coração;
- que a pele enrugada, o corpo franzino e os cabelos brancos carregam consigo as belezas da existência;
- que na vitória muitos estarão ao nosso lado, apesar da maioria não ter participado da caminhada e nem compartilhado de nossas lutas;
- que um abraço sincero tem o poder de salvar pessoas - e vidas - de um dia ruim;
- que a inveja habita onde menos esperamos, vivendo à espreita e torcendo contra nós. Às vezes está tão próxima, que é capaz de usar o disfarce da admiração e do zelo com perfeição, a ponto de ser cultivada;
- que nossos pais são nossos melhores amigos e nossos filhos o maior tesouro...e que nossa família é uma benção indescritível;
- que não ter um número de amigos "de fé" que preencha duas mãos (às vezes uma), não é questão de pessimismo, e sim, uma dura realidade;
- que não seremos amados ou sequer bem quistos por todos e que o mundo, além de imprevisível, é implacável;
- que teremos dias péssimos, com derrotas amargas... cairemos...e teremos de passar por isso muitas vezes sozinhos. O comércio vai funcionar, o noticiário vai acontecer, os vizinhos irão viajar e todas as pessoas seguirão suas vidas normalmente enquanto sofremos. Apesar de frustrante, isso fará com que levantemos ainda mais fortes;
- que há momentos em que é bom - e necessário - partir e, certamente, é ótimo ter para onde voltar. Contudo, aproveitar a jornada talvez seja o grande segredo e a maior sacada de todas;
- que não é mentira ou enganação: a felicidade realmente está nos detalhes, nas pequenas coisas. Uma canção com memórias antigas, um doce com cheiro de infância, um olhar de aprovação e cumplicidade, um chimarrão ao sol, um abraço ao entardecer... Um sorriso carregado de puro amor;
- que a saúde é uma dádiva, e desperdiçá-la não é somente uma tolice, é também uma afronta a tantos que oram por mais um dia junto aos seus;
- que viver vai muito além de existir, e que a  solidariedade e a gratidão são sentimentos transformadores, com os quais somos capazes de realizar verdadeiros milagres;
- que é preciso sonhar muito, realizar sempre e amar infinitamente. Somos perfeitamente capazes de moldar nossos destinos e auxiliar ao próximo, das mais variadas formas possíveis;
- que Deus existe sim, mas não em templos de cimentos, em imagens repletas de ouro ou nas palavras vãs de falsos profetas. Deus vive em nós. Precisamos aprender, cada vez mais, a agir com amor e fraternidade e, aí sim, Ele estará em todos os lugares e será, definitivamente, Onipresente.
Há algo no fim do arco-íris, para cada um de nós. E lá encontraremos os frutos do que semeamos em nossa trajetória. Ouro ou lata... Mel ou fel...dor ou amor... Simples assim....


segunda-feira, 3 de julho de 2017

QUANDO UM AMOR SE VAI



Quando um amor se vai, parte com ele o bom dia e todo ânimo sucumbe, negligenciando os apelos da alma, apesar do aroma reconfortante do café... os dias se tornam nublados, antes mesmo do sol raiar. Correr na chuva já não tem mais graça, e a mão que pegava a outra ressente-se do frio, ao caminhar sozinha...
Quando um amor se vai, as bicicletas são entregues ao pó das garagens e as praças que abrigavam tardes de chimarrão, se tornam lugares chatos para pessoas desocupadas...
Quando um amor se vai, fecham-se as portas dos cinemas e a nossa memória lamenta o gosto da pipoca e do sorvete... e dos beijos... não há mais tempo para olhar vitrines à toa, não há mais sentido em lanchar na rua ou em achar graça dos próprios sapatos...
Quando um amor se vai, as ruas ficam estreitas, os sonhos ficam amargos, as noites são mais escuras... o entardecer se torna enfadonho, chegando a ser ofensivo... as estrelas não são mais poemas, a lua perde a beleza e a madrugada é só mais um fardo...
Quando um amor se vai, os livros são poços profundos, as palavras perdem o sentido e toda música é um punhal... cada lembrança é um tiro dilacerante, não há piedade, e toda injustiça se faz... o olhar não encontra abrigo...
Quando um amor se vai, o coração é ferido de morte... e sobreviver é só mesmo um castigo... o espírito faz viagens em vão... a nostalgia tem um abraço tenaz, e trás mil chagas consigo...
Quando um amor se vai, toda borboleta é igual, e as estações são somente ciclos de dor... as cores não falam aos olhos, e a natureza emudece...o tempo cruza sem pressa, provando cada mazela exposta...
Quando um amor se vai, o mar perde a beleza, o campo perde o encanto e o vento canta as suas cantilenas de solidão, soprando velas de desesperanças ... as revoadas de pássaros rumam sem norte, rimando com saudades infindas...
Quando um amor se vai, o silêncio fala mais alto, e os ouvidos são moucos aos que gritam paixões... a felicidade arruma suas malas e parte, sem nem dar adeus. Os horizontes são distâncias cinzentas, e o medo ganha coragens de ser...
Quando um amor se vai, a lágrima é sal e mais nada... o vidro dos olhos faz refletir o infortúnio... a tristeza banca a parada, e o que brota no peito não tem razões para seguir...
Quando um amor se vai,
(Eu acredito)
Deus pede perdão...


Imagem: Google imagens/sem autoria

 

sábado, 1 de julho de 2017

TEMOS SIDO GENIAIS???

Graças a Deus, de tempos em temos o mundo é abençoado com a genialidade, o talento e a visão especial de alguns seres diferenciados. Eles chegam (alguns ainda estão por aí), dão sua contribuição, modificam o mundo - e as pessoas - e partem. É assim nas artes,  nas ciências, na política, enfim... em todas as áreas.
São pessoas iluminadas, capazes de modificar o centro de tudo, de rever posicionamentos, de abrandar dores, de encontrar um novo olhar sobre questões em que pairam místicas que em nada contribuem para um melhor viver.
Deus sabe que o mundo precisa de pessoas assim. E nós também sabemos.
Contudo, penso que as grandes questões para o indivíduo, saindo do contexto social mais abrangente, estão ao nosso redor, em nosso cotidiano, no nosso dia a dia. E nessas questões, os grandes gênios dificilmente interferem. Pelo menos, não diretamente. Podemos refletir escutando uma boa música de Renato, Gessinger, Toquinho, Lenon, Djavan ou, ainda, viajar e viver outros tempos num livro de Érico, Suassuna, Eça de Queiróz... Quem sabe, ainda, nos embriagarmos em poesias de Pablo Neruda, Vinícius ou Quintana?
Há aqueles que,  como eu, também divagam e se preocupam em estudar as questões políticas e sociais, tentando entender por meio da ciência política e filosófica o porquê do mundo viver momentos tão conturbados. E para isso, não há Cortella, Nietzsche, Kant, Platão, Sócrates ou Santo Agostinho que resolva. O mundo é extremamente dinâmico, e hoje em dia, ainda mais.
E aí está o "X" da questão, que ora se impõe. Muitas vezes perdemos um tempo considerável em meio a situações complexas, de difícil - ou impossível - resolução, num emaranhado de dúvidas que, não raro, não leva a lugar nenhum. E isso não é ruim, ao contrário. O ser humano, dotado de inteligência e o mais autônomo dos seres (em essência), tem essas questões em seu DNA. Assim caminha a humanidade. Porém, e à nossa volta? Como temos modificado o nosso "pequeno mundo"? Como temos influenciado nosso dia a dia? Temos sido capazes de agir positivamente entre os mais próximos, os mais queridos ou com aqueles com os quais ao menos convivemos mais rotineiramente? É certo que somos a soma e o resultado de tudo que vivenciamos, aprendemos, escutamos, lemos, perdemos e ganhamos nessa vida. Uma somatização de nossas boas e más experiências. Mas o que temos feito com isso?
Transformamos a vida de alguém para melhor, ainda que minimamente? Nos policiamos em nosso humor, em nossas línguas ferinas, em nosso trato diário para com os outros? Nossas mãos têm estado estendidas ao próximo? Nossos pensamentos são solidários, nosso mente é aberta? Nosso abraço é apertado e fraterno, nosso sorriso é sincero?
Acredito que pessoas que conseguem, na prática e na realidade, responder sim a alguns desses questionamentos, são efetivamente pessoas geniais. Seres humanos especiais. Agentes transformadores. Almas que modificam vidas e melhoram caminhos.
É genial ser gentil, não ser prepotente, ser humilde, mas não submisso. É genial amar a família - e demonstrar - e também cuidar dos filhos, dos pais... Beijar o marido ou a esposa, dizer que ama e admira, apesar das diferenças que nos tornam tão iguais.
Pensemos sobre isso.
A genialidade não consiste somente em ser um grande compositor, escritor, pensador ou intelectual. Ela está presente também em pequenos atos, na bondade cotidiana, no amor sem segundas intenções, na abnegação, no auxílio sem recompensa... Ela habita na sinceridade, na solidariedade, no bem querer.
Portanto, sejamos geniais. Nós podemos.




segunda-feira, 26 de junho de 2017

FELIZ PELOS OUTROS

Qual foi a última vez em que nos sentimos bem com o sucesso, com a vitória e com a prosperidade do outro? As batalhas vencidas por um amigo são capazes de nos emocionar, de nos alegrar e de despertar em nós um sentimento de felicidade? A conquista de outras pessoas nos motiva, eleva nosso grau de bem estar e a capacidade de disseminar o bem?
Temos enviado energias positivas aqueles que nos cercam e aos que travam embates que talvez não tenhamos sequer a coragem de tentar?
Compartilhamos de forma saudável as boas novas que chegam de terceiros? Temos tido um olhar aprovador aqueles que buscam incansavelmente seus sonhos e persistem na luta por seus ideais?
Nossa palavra tem sido incentivadora a quem muitas vezes precisa apenas de um simples gesto de amizade e empatia para não desistir?
Temos trabalhado nosso lado humano, solidário e fraterno, ou temos sido parceiros somente nas derrotas, nas tristezas e nos fracassos? Afinal, como disse Giovanni Boccaccio, "apenas a miséria é sem inveja".
Vacine-se contra a inveja (a sua própria). A felicidade sorri aos que são capazes de admirar e torcer pelo próximo.
Que possamos alimentar a parte de nós onde habita o amor, o companheirismo e a bondade. Que possamos render homenagens aos triunfos alheios.
E que a inveja e todo o mal morram de inanição.
Amém!

terça-feira, 13 de junho de 2017

O QUE TEMOS TATUADO EM NOSSOS CORAÇÕES?



O caso do garoto que teve sua testa tatuada com a frase “sou ladrão e vacilão”, é surreal. Tanto pela brutalidade do ato praticado, quanto pelo lado das reações da sociedade à situação.

Confesso que custei um pouco a assimilar o fato, e emitir uma opinião é quase como cair numa “pegadinha”, tendo em vista a insegurança que nos cerca, que nos oprime e nos ameaça em nosso cotidiano. Algo do tipo, e se fosse contigo?

Pois é, faz a gente refletir. Mas, se fosse comigo, certamente eu não teria aquele atitude covarde, não teria praticado tal prevalecimento, coisas que a gente só vê serem feitas por indivíduos que atuam em organizações criminosas.

Não há como se afastar dos fatos e do que efetivamente ocorreu: a prática de um crime. E não falo aqui da suposta tentativa de furto da bicicleta, mas sim do ato praticado pelo tatuador e seu cúmplice. Sim, exatamente. O que os dois supostos “novos heróis” fizeram é crime. Simples assim. Basicamente, tortura. Além de outras práticas indecentes e penduricalhos criminais que podem ser acostados ao fato.

Existe uma larga diferença entre legítima defesa e o que os dois “cidadãos” fizeram ao rapaz.  Justiça com as próprias mãos? Com certeza, não. Um ato de crueldade apenas. Uma reação totalmente desproporcional, fora de qualquer parâmetro de humanidade. A desproporcionalidade é tanta que sequer cabe comparar à “Lei de Talião”. Foi um ato de banditismo mesmo. Impensado? Talvez. Ou com certeza. O problema é que os resultados desse momento “justiceiro” somente serão apagados com procedimentos cirúrgicos, através de muita dor, num caminho largo de diminuição e humilhação daquele que passou de meliante à vítima. Para alma, talvez indeléveis.

Eu mesmo sou defensor de reações fortes em casos de crimes bárbaros, mas me permito dizer que esse não era o caso.

Vejam quanto há de inutilidade, descabimento e maldade contidos nesse crime inusitado. A “animaleza” e frieza dos criminosos é chocante. Houve tempo para arrependimento, para repensar a atitude. Mas eles seguiram adiante.

É impossível para um ser humano que possui um mínimo de bom senso e bondade no coração, permanecer inerte ao fato e não se comover com tamanha crueldade e prevalecimento.

A sociedade necessita, com certeza, de mais empatia. Os argumentos de que estamos fartos de impunidade, de injustiças e tudo mais, não cabe nesse caso. Não há desculpas para a barbárie.

Até mesmo porque muitas dessas pessoas que assim argumentam, não são exemplos de honestidade, de retidão de caráter ou hombridade. Nesse sentido, vi uma charge muito feliz acerca do assunto (não sei o autor) em que pessoas defendiam esse ato horrendo, enquanto em suas testas estavam tatuadas sentenças como: “eu desvio TV a cabo”, “eu compro fiscais”, e por aí vai.

Vejam o quanto é complexo e distorcido o senso de correção das pessoas. Os valores estão invertidos, as coisas estão literalmente fugindo ao controle.

Atitudes e crimes como esse estão muito, mas MUITO à margem de uma sociedade que busca ser mais justa, equilibrada e igualitária. Na verdade, estão totalmente na contramão do que devemos cultivar e praticar em nosso dia a dia.

Como pai de família e cidadão, entendo a revolta mediante tudo que vemos de errado todos os dias.

Mas como ser humano e defensor do Direito e dos direitos das pessoas, tenho a mais ABSOLUTA CONVICÇÃO de que este não é o caminho a ser trilhado. Mais do que isso, creio que nossos conceitos devem ser repensados com urgência, especialmente em um momento tão conturbado e incerto como este em que estamos vivendo, imersos em questões tão preocupantes e nada promissoras.

Colocar-se no lugar do outro é necessário, para que possamos conter nossos ânimos e instintos mais injustos, vergonhosos e irracionais.

Sejamos defensores dos nossos direitos, ávidos em proteger e auxiliar os nossos, proativos e atuantes, contestadores e bravios. O mundo realmente precisa disso. Mas não ultrapassemos a linha do aceitável, do correto. Guardemos as devidas proporções e a medida da justiça em nossas reações e atos. Que nossas mãos estejam limpas... que nossa consciência permanece leve.

Afinal, o que temos tatuado em nossos corações?



Bagé, 13/06/17

Caine Garcia