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quarta-feira, 27 de abril de 2016

AS DORES DO FRIO



Não gosto de inverno/frio. Na verdade, detesto. Ele agasalha e conforta somente quem tem um mínimo de sorte nessa vida. Judia de quem já tem pouca ou quase nenhuma fé. Ele encurta a vida do sol. Ele prolonga a audácia da preguiça. Diminui os círculos de interação. Desprivilegia o contato menos íntimo. É sisudo.
Há quem diga que é elegante, mas eu o vejo como prepotente e desalmado. Não há pessoas na frente das casas, nem jardins coloridos, nem crianças sorrindo à vontade. Há pressa nas ruas, há cumprimentos gelados, não há receptividade à mostra. O inverno/frio é silencioso, sujeito ao egoísmo, ao entranhamento, às portas fechadas.
O inverno/frio é feio em sua beleza, sedutor em suas artimanhas de fazer-nos menos afeitos ao compartilhamento de ideias, de espaço, de abraços, de aceitação. Nossos casulos se tornam ainda mais privados e inacessíveis, sem que percebamos.
              Diante de tudo isso, ter um prato quentinho todo dia, chega a ser doloroso. Quase um crime. Uma bonança indigesta. Ter um cobertor é praticamente uma afronta. Sem hipocrisia. Só constatação e sentimento. Sei que a miséria existe o ano todo. Aliás, todos sabemos disso. Porém, o frio é mais invasivo. É mais doído. É mais impiedoso.
              O espírito gelado do inverno/frio não se compadece de crianças, não tem pena dos idosos. Não se abate com a miséria, tampouco entende quem vive qual pária. Alia-se à fome, ao medo, a solidão e tantas outras mazelas, com suas garras dolorosas e insensíveis, a fim de penetrar no mais profundo do ser, retirando de lá o ânimo, a esperança e quase obstruindo toda e qualquer luz.
              Quem necessita não espera algo mais do inverno/frio. Espera algo mais de nós. Mas estamos/estaremos enclausurados demais para atendermos esse chamado.
Minha alma vive a inquietude desses momentos, as desigualdades dessa estação. Sendo humano, sofro mediante nossa desumanidade.
               Não te gosto, frio. Só te admiro em tua perseverança de ser... e passar.

Fonte da imagem: Google imagens/sem autoria






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