Não gosto de
inverno/frio. Na verdade, detesto. Ele agasalha e conforta somente quem tem um
mínimo de sorte nessa vida. Judia de quem já tem pouca ou quase nenhuma fé. Ele
encurta a vida do sol. Ele prolonga a audácia da preguiça. Diminui os círculos
de interação. Desprivilegia o contato menos íntimo. É sisudo.
Há quem diga
que é elegante, mas eu o vejo como prepotente e desalmado. Não há pessoas na
frente das casas, nem jardins coloridos, nem crianças sorrindo à vontade. Há pressa
nas ruas, há cumprimentos gelados, não há receptividade à mostra. O
inverno/frio é silencioso, sujeito ao egoísmo, ao entranhamento, às portas
fechadas.
O inverno/frio
é feio em sua beleza, sedutor em suas artimanhas de fazer-nos menos afeitos ao
compartilhamento de ideias, de espaço, de abraços, de aceitação. Nossos casulos
se tornam ainda mais privados e inacessíveis, sem que percebamos.
Diante
de tudo isso, ter um prato quentinho todo dia, chega a ser doloroso. Quase um
crime. Uma bonança indigesta. Ter um cobertor é praticamente uma afronta. Sem hipocrisia.
Só constatação e sentimento. Sei que a miséria existe o ano todo. Aliás, todos
sabemos disso. Porém, o frio é mais invasivo. É mais doído. É mais impiedoso.
O
espírito gelado do inverno/frio não se compadece de crianças, não tem pena dos
idosos. Não se abate com a miséria, tampouco entende quem vive qual pária. Alia-se
à fome, ao medo, a solidão e tantas outras mazelas, com suas garras dolorosas e
insensíveis, a fim de penetrar no mais profundo do ser, retirando de lá o
ânimo, a esperança e quase obstruindo toda e qualquer luz.
Quem
necessita não espera algo mais do inverno/frio. Espera algo mais de nós. Mas
estamos/estaremos enclausurados demais para atendermos esse chamado.
Minha alma
vive a inquietude desses momentos, as desigualdades dessa estação. Sendo
humano, sofro mediante nossa desumanidade.
Não
te gosto, frio. Só te admiro em tua perseverança de ser... e passar.
Fonte da imagem: Google imagens/sem autoria
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